terça-feira, maio 27, 2008

MP sugere um quarto envolvido no caso Lucas Terra

Promotor Davi Gallo nega haver provas concretas, mas diz que suspeita baseia-se no ‘modus operandi’ do crime

Perla Ribeiro

As investigações do Ministério Público Estadual (MPE) apontam para a possibilidade de um quarto envolvido no assassinato do adolescente Lucas Terra. Porém, o promotor da 2ª Vara do Júri, Davi Gallo Barouh, informa que as suspeitas não são baseadas em provas concretas, mas sim, em especulação jurídica. A tese é sustentada pelo modus operandi do crime. O promotor parte do pressuposto de que os três acusados não dariam conta sozinhos do crime e que essa quarta pessoa teria participado na ocultação e desova do cadáver.


Apesar da especulação, Gallo diz que as investigações continuam e aposta que novos fatos surgirão com os depoimentos do pastor Fernando Aparecido e do pastor Joel Miranda. Enquanto o primeiro continua foragido, Aparecido será interrogado hoje, na 2ª Vara do Júri. “Pode ser que muita coisa apareça com a instrução criminal”, cogita o promotor. A defesa do pastor não descarta a possibilidade de haver essa quarta pessoa e até especula duas outras possibilidades.


“Como o pai do garoto tem muitos inimigos, pode ser que alguém se vingou dele com a morte do filho. Também tem o obreiro Luciano, que foi visto no dia do crime acompanhado de Lucas e do pastor Sílvio Galiza”, sugere o criminalista Mário de Oliveira Filho. O pai de Lucas, Carlos Terra, também acha cabível a existência de mais um culpado, mas prefere silenciar sobre suas impressões. “Não posso afirmar nada nesse sentido porque não tenho como provar”, esquiva-se, alimentando o suspense.


Recusa - Preso na última sexta-feira em Jaboatão dos Guararapes, no Recife, Aparecido seria apresentado ontem à imprensa durante coletiva no prédio da Secretaria de Segurança Pública (SSP), da Piedade. Entretanto, recusou a aparição pública. Além de a recusa ser um direito assegurado pela Constituição Federal, a defesa do pastor também entrou com uma petição na 2ª Vara do Júri requerendo esta garantia. Já para a audiência de hoje, sua presença é obrigatória.


A única possibilidade de ausência seria por um problema de saúde, mas o promotor já adianta: “Se isso ocorrer, pediremos que ele seja avaliado por uma junta médica. Já adiaram demais. Não vamos mais permitir manobras da defesa”, explicou o promotor Davi Gallo. Embora o próprio delegado chefe da SSP, Joselito Bispo, tenha informado que o bispo participará hoje de uma acareação com o já acusado Sílvio Galiza, Gallo diz que primeiro ocorrerá o interrogatório. Só depois, poderá ser marcada a acareação.


Mantido desde o último sábado sob a custódia na sede do Departamento de Polícia Interestadual (Polinter), Fernando Aparecido terá o próximo destino definido hoje pelo titular da 2ª Vara Júri, o juiz Vilobaldo José de Freitas Pereira. Quanto a Joel Miranda, o delegado-chefe da SSP informou que as buscas continuam no estado do Rio de Janeiro. “Já localizamos a residência dele em Cabo Frio, mas não o encontramos. O trabalho das buscas continua até que consigamos efetivar a prisão”, disse Bispo. No Rio, a diligência está sendo coordenada pelo diretor do Comando de Operações Especiais da Polícia Civil (COE), Jardel Perez.


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RETROSPECTIVA


O CRIME aconteceu em 21 de março de 2001 e obteve repercussão internacional. De acordo com os autos do processo que tramita na 2ª Vara do Júri, Lucas Terra, então com 14 anos, sofreu abuso sexual e foi estrangulado no templo da Igreja Universal do Reino de Deus (Iurd) no Rio Vermelho. Imaginando que o garoto estivesse morto, os criminosos incendiaram o corpo em um terreno baldio às margens da Avenida Vasco da Gama.


Posteriormente, um laudo do Departamento de Polícia Técnica apontou que a vítima ainda estava viva quando lhe atearam fogo. Lucas era o caçula do casal José Carlos e Marion Terra. O adolescente passou a freqüentar a Iurd por causa da primeira namorada, que era obreira. Embora os pais não freqüentassem a instituição, acreditavam que o filho estaria seguro indo aos cultos.


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Pai da vítima mantém peregrinação

Enquanto a defesa do pastor Fernando Aparecido se movimenta para entrar com o pedido de habeas-corpus do cliente, o empresário e pai de Lucas, Carlos Terra, faz o movimento contrário – quer barrar o pedido. Ontem, a peregrinação começou cedo. Antes de o Tribunal de Justiça ser aberto, ele já aguardava na porta. A expectativa era de ser recebido pela presidente da casa, Sílvia Zarif. Não carregava nenhuma tese jurídica para justificar o apelo: “Fui pedir como pai que a Justiça baiana não conceda o habeas-corpus”, contou.


Como Zarif participava de eventos externos, deixou registrado o pedido com a sua secretária. De lá, Carlos Terra seguiu rumo ao Fórum Ruy Barbosa, no Campo da Pólvora. Visita costumeira do local, ele queria confirmar a audiência marcada para hoje. A próxima parada foi na Polinter, onde se informou sobre a permanência do pastor na unidade e recebeu com decepção a notícia de que ele não se apresentaria para a imprensa. “Até hoje eles se sobrepuseram à Justiça, é uma estratégia da defesa para resguardá-los. Mas não sou só eu que quero justiça, a sociedade baiana também quer”, disse o pai.


Vestido de preto dos pés à cabeça, ele disse que só vai tirar o luto quando conseguir colocar todos os responsáveis pela morte do filho atrás das grades. Hoje, Carlos Terra volta à 2ª Vara do Júri e, num protesto silencioso. Levará consigo imagens de Lucas vivo e do corpo carbonizado. “É duro e cruel, mas é necessário”, justifica, referindo-se às imagens.


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Defesa do pastor alega arbitrariedade

Bruno Wendel


Prisão arbitrária. É o que alega o advogado criminalista Mário de Oliveira Filho, defensor do pastor Fernando Aparecido da Silva, preso no final de semana pela morte brutal do adolescente Lucas Terra, violentado, estrangulado e depois queimado vivo em 21 de março de 2001. Durante coletiva à imprensa ontem à tarde, Mário Filho afirmou que seu cliente não foi arrolado no inquérito e que o juiz titular da 2ª Vara do Juri de Salvador, Vilebaldo Freitas, que determinou a prisão preventiva na quarta-feira, agiu motivado por apelação pública. Em contrapartida, o promotor David Gallo dispara: “Eles estão brincando com o processo. Não compareceram a três acareações e por isso o juiz expediu o mandado”.


Ex-advogado de Suzane von Richthofen, ré confessa do assassinato dos pais, Manfred e Marísia von Richthofen, em outubro de 2002, Mário também é o defensor do pastor Joel Miranda, igualmente acusado de participação na morte de Lucas Terra, que está foragido. O criminalista disse que seus clientes não compareceram às audiências marcadas em Salvador porque estavam cobertos por uma carta precatória concedida pelo próprio juiz Vilebalo. Ou seja, reservavam a eles o direito de serem interrogados na comarca de Pernambuco, onde residiam. Disse também em que o nome de Fernando não está inserido no inquérito que apura a morte do adolescente e que por isso ele nem poderia ser interrogado.


O advogado criminalista afirmou ainda que, mesmo assim, Fernando vem colaborando com o andamento do processo e que embarcaria ontem num vôo da TAM para Salvador, onde compareceria ao interrogatório, no Fórum Ruy Barbosa. Com base nessas condições, Filho dará entrada hoje com um pedido de habeas-corpus no Tribunal de Justiça do Estado e ao Superior Tribunal de Justiça.


No entanto, o promotor Davi Gallo não acredita que os acusados venham a ser beneficiados pelo habeas-corpus. “A prisão foi bem fundamentada, não creio nessa possibilidade”. Gallo não negou que o juiz concedeu o direito dos acusados serem interrogados foram do estado, mas, segundo ele, Fernando e Joel teriam que comparecer também às acareações em Salvador, onde ficaram cara-a-cara com o pastor auxiliar Silvio Galliza (condenado a 18 anos de prisão em regime fechado).


“Sobre as ausências nas acareações, os advogados da Iurd alegaram que a instituição não tinha o dinheiro para as passagens. Como pode? Não tem recursos para a deslocamento de um estado para outro, mas tem para bancar uma série de defensores por tempo indeterminado num hotel de luxo da cidade. É inadmissível. Eles estão brincando com Justiça baiana”, esbraveja. Ainda segundo Gallo, consta na denúncia feita ao Ministério Público que Fernando teria participado da ocultação do cadáver.

(Correio da Bahia Online - 27.05.2008)